Depois de 180 dias de sua promulgação, a Lei no. 14.478/2022, que regula o mercado de criptomoedas no Brasil, começa a vigorar em 20 de junho de 2023, com a promessa de organizar o ambiente de negócios de investimentos e operações com ativos virtuais.
Ainda como novidade, o Decreto 11.563/2022, regulamentador da Lei, estabeleceu que o Banco Central do Brasil será a autoridade competente para autorizar o funcionamento das corretoras de criptomoedas, que assim dependerão de licença específica da autoridade monetária central para operar, exigindo dessas empresas um nível mais elevado de compliance e aderência às normas regulamentares. Por outro lado, a CVM manterá competência para fiscalizar os ativos que forem considerados valores mobiliários.
Porém, como o Decreto foi promulgado às vésperas de vigência do novo marco legal, nem o Banco Central nem a CVM editaram suas normas regulamentares, retirando alguns efeitos práticos da nova legislação, persistindo a incerteza sobre a situação das empresas que já estão em atividade e para as novas operações, inclusive diante da ausência das normas de conformidade que deverão ser seguidas, mantendo ainda esse ambiente de incerteza até que normas complementares sejam expedidas pelo Bacen e CVM.
Por outro lado, certos aspectos da Lei já estão em vigor, como por exemplo, a alteração do Código Penal, que passou a contar com a inclusão do artigo 171-A, estabelecendo o crime de fraude com a utilização de ativos virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros, com pena de 4 e 8 anos e multa anos para quem “organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações que envolvam ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento”.
Essa eventual conduta delituosa não comportará acordos de encerramento da ação penal por meio de transação, podendo assim levar à eventual prisão dos envolvidos. O crime de lavagem de dinheiro também teve a pena aumentada de 1/3 a 2/3 caso a operação seja realizada por meio de organização criminosa ou por intermédio de ativos virtuais.
Com mais rigor penal, espera-se que a nova regulamentação impacte o ambiente jurídico mas também busque proteger os consumidores finais que muitas vezes são envolvidos em golpes do mercado financeiro por conta dos esquemas das pirâmides financeiras. Apenas no ano de 2022, a Receita Federal informa que os investidores movimentaram cerca de R$ 200 bilhões em operações com ativos virtuais.
A nova legislação cria ainda o conceito de ativos virtuais (o que inclui as criptomoedas, tokens, stablecoins, meme coins, etc.) e por conseguinte as empresas prestadoras de serviços de ativos virtuais, conhecidas no mercado como exchanges, que executam, em nome de terceiros, pelo menos um dos serviços de ativos virtuais definidos em lei.
Essas empresas passam ainda a constar no rol de atividades obrigadas a identificar clientes e operações sujeitas às medidas de prevenção de lavagem de dinheiro, tornando-as equiparadas à instituição financeira, o que pode alcançar os atos praticados por seus administradores nos crimes contra o sistema financeiro nacional.
Com a nova legislação, espera-se que o mercado encontre maior certeza jurídica e com regulamentação adequada aos demais países que estão buscando proteger o setor financeiro. Porém, a necessidade de adequação trará desafios não apenas para as empresas do segmento, como também para as autoridades reguladoras envolvidas e o ambiente de negócios em geral, sendo extremamente importante um aprofundamento dos estudos da nova legislação e seus impactos sobre cada atividade.