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MARÇO 17 - Vinícius Zwarg - taxa corretagemA legalidade de cobrança sobre a taxa de corretagem na aquisição de imóveis é discutida com frequência pelo Judiciário brasileiro. Tanto, que o ministro do Superior Tribunal de Justiça, Tarso Sanseverino, determinou a suspensão de todos os processos em curso no país para um entendimento uniformizado das decisões judiciais.Até o final de 2015, havia 1.446 processos suspensos por determinação do STJ. A determinação do ministro Sanseverino busca dar uma única orientação para os processos nos tribunais, não admitindo novos recursos.

Para falar sobre a legalidade da cobrança e o entendimento do judiciário, entrevistamos o especialista em Relação de Consumo, Vinícius Zwarg.

Obra24Horas: O que diz a lei a respeito da corretagem?

Vinícius Zwarg: Segundo nossa legislação, trata-se de um contrato pelo meio do qual uma pessoa não ligada a outra em virtude do mandato, da prestação de serviços ou qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas.

Obra24Horas: Por que apenas nos últimos anos ela passou a ser considerada ilegal pela maioria dos juízes?

Vinícius Zwarg: Até o advento do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (1990), a corretagem era basicamente tratada somente à luz do Código Civil e legislação correlata. Com a sanção do CDC, passamos a ter a aplicação de seu regramento, devendo-se observar, dentre outros, o direito básico do consumidor de informação, a proteção contra práticas e cláusulas abusivas impostas no fornecimento de serviços e, sobretudo, ao reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor. Outro aspecto que contribui para esta percepção (de que a cobrança passou a ser considerada como ilegal) é que, nos últimos anos, houve um boom imobiliário, o que gerou um aumento natural de ações no Poder Judiciário.

Obra24Horas: Por que as construtoras insistem em cobrar essa taxa? Há alguma lacuna na legislação que permita essa cobrança?

Vinícius Zwarg: A razão é a transferência do custo. Caso o STJ entenda pela ilegalidade da cláusula validade da cláusula contratual que transfere ao consumidor a obrigação de pagar comissão de corretagem haverá uma recomposição de preço. Mas insisto, temos que aguardar a decisão do STJ.

Obra24Horas: Adquirir um imóvel no próprio estande de vendas ou por um corretor autônomo dão resultados jurídicos idênticos?

Vinícius Zwarg: A meu ver são situações completamente distintas, pois, em se tratando de imóvel comercializado na planta a negociação é feita, via de regra, no stand de vendas instalado junto ao terreno no qual será erguido o empreendimento, sendo que a corretora invariavelmente atua no interesse da incorporadora (responsável direta pela contratação da corretora). Trata-se, portanto, de uma venda direta. Já a aquisição feita através de corretor autônomo se dá de forma completamente diversa, eis que este atua na realização de determinada incumbência não habitual e sem nenhum outro vínculo de mandato. Ou seja, o corretor está contratado para uma finalidade específica. Tais circunstâncias resultam, a meu ver, em resultados jurídicos distintos.

Obra24Horas: Qual foi o entendimento atual majoritário do Judiciário Brasileiro para suspender todos os processos em curso no país?

Vinícius Zwarg: A questão é controversa. Ouso dizer que nos casos em que o consumidor foi em busca do negócio (ele procurou o stand de vendas da incorporadora) o entendimento majoritário é pela ilegalidade da cobrança. No entanto, também existem decisões em sentido contrário entendendo pela legitimidade da cobrança (repasse de custos e/ou composição de preços), quando há previsão contratual e informação adequada ao consumidor.  Em razão disso, a fim de uniformizar as decisões a respeito do tema, decidiu-se pela suspensão de todas as demandas em trâmite até uma definição do assunto por parte do STJ.

Obra24Horas: Qual o impacto dessa decisão e quanto tempo pode demorar para ser tomada uma decisão final pelo STJ?

Vinícius Zwarg: Do ponto de vista prático, a decisão suspende um número expressivo de ações com questões idênticas (inclusive as de 1ª instância). Segundo o TJ/SP, já existem milhares de ações afetadas pelo recurso representativo da controvérsia. A uniformização a ser feita é com relação a duas questões: (i) prescrição da pretensão da restituição das parcelas pagas a título de corretagem e de assessoria imobiliária; (ii) validade da cláusula contratual que transfere ao consumidor a obrigação de pagar comissão de corretagem e taxa SATI (serviço de assessoria técnico-imobiliária).

Obra24Horas: Qual a orientação a quem já comprou? E para quem vai comprar?

Vinícius Zwarg: Quem já moveu uma ação judicial para discutir a legalidade da cobrança de corretagem terá sua ação suspensa em razão da recente decisão do STJ. Quem ainda não moveu uma ação pode aguardar a decisão do STJ, todavia, considerando que a discussão também versa com relação ao prazo prescricional, sugiro que tal acompanhamento seja feito através de advogado que conheça a legislação. Ademais, vale lembrar que a decisão não inibe a propositura de novas ações – pelo contrário, não cria nenhum óbice. Quem vai comprar um imóvel no stand de vendas dificilmente conseguirá, nesse momento, fugir daquilo que determina a grande maioria dos contratos de adesão. No entanto, ainda que venha a pagar este valor, poderá discutir judicialmente, pleiteando a nulidade da cláusula, bem como a restituição da quantia paga a título de corretagem.

Obra24Horas: É possível pedir a repetição do indébito (dobro do valor pago a maior)?

Vinícius Zwarg: Conforme estabelece o CDC, o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro que pagou o excesso. No entanto, infelizmente existem muitas decisões entendendo pela repetição do indébito (em dobro) somente nos casos em que está configurada a má fé do fornecedor (engano injustificável). Aqui acho que poderíamos avançar, pois esta não me parece a melhor interpretação do comando do art. 42, parágrafo único, do CDC.

Obra24Horas: Legalmente qual seria o cenário ideal tanto para as construtoras quanto para o consumidor no que diz respeito a taxa de corretagem?

Vinícius Zwarg: Um cenário ideal está ligado a um ambiente jurídico mais seguro, pacífico, a despeito do um conflito natural de interesses. Quem adquire um imóvel junto a um stand de venda tem dúvida com relação a legalidade da cobrança de corretagem, e isto não é positivo. Uma boa decisão do STJ é muito bem-vinda.

Obra24Horas: Alguma outra consideração importante.

Vinícius Zwarg: Ressaltaria que boa parte das ações que discutem a corretagem, também versam a respeito da legalidade da SATI (Serviços de Assessoria Técnico Imobiliário) cujo posicionamento do Poder Judiciário é, via de regra, pela sua ilegalidade. Por força do mesmo representativo da controvérsia estão também suspensas as ações que estejam discutindo a legalidade da SATI.

Entrevista concedida para a jornalista Érica Nacarato, do Portal Obra24horas.